“Se não vais para a escola, vais para a costura!”

Um castigo mudou por completo a vida de Otília Nunes. Nesta conversa com O ALMEIRINENSE revela (todos) os pormenores de umas mãos que valem ouro e que já fizeram milhares de peças. Hoje o ritmo é outro…

Como começou a costurar? Que idade tinha?

Aos 12 anos fiz uma “birra” por causa da escola. O meu percurso escolar correu sempre bem até ao final do 6.⁰ ano. A matrícula do 7.⁰ ano foi feita, os livros comprados e estava tudo preparado para iniciar mais um ano letivo. E iniciei! Saí de manhã para a escola e, quando regressei, informei os meus pais que não queria mais ir à escola. A minha mãe ralhou, barafustou, mas o meu argumento prevaleceu. Eu não queria aquilo, não gostava do ambiente, não gostava da escola e não me apetecia ir. Então a minha mãe deu-me um castigo (achava ela): “Se não vais para a escola, vais para a costura! “. E eu, do alto dos meus 12 anos, não estive com meias medidas: “ Está bem! Vou para a costura!” Além do mais, eu queria muito uma bicicleta e o meu pai não havia meio de me comprar uma. Então eu vi ali uma ótima oportunidade de ganhar a bendita da bicicleta, uma vez que, para ir para a costura, o caminho ainda era longe. Não contei foi com o facto de, ao lado da minha casa, haver uma costureira… Lá se foi a bicicleta! Mas depois comprei uma, muito mais tarde.

Com quem aprendeu?

Aprendi com uma vizinha que era costureira e recebia algumas meninas a quem ensinava. Tive a companhia de uma prima que já lá andava a aprender a costurar. Estive ainda uns anos a aprender a costurar, porque ainda era muito novinha e porque dali só se saía quando os pontos ficavam perfeitos. Depois, já mais velhinha, quando achei que já sabia costurar realmente bem, aprendi a fazer o corte e daí em diante comecei a fazer os meus próprios trabalhos.

O que mais gosta de costurar?

Eu gosto de costurar e pronto! Gosto de costurar em série. Trabalhei para fábricas e fazer costura em série é muito mais rentável, não tanto em ganho monetário, mas em tempo e organização de trabalho. Mas também gosto de trabalhar peças únicas. Gosto de desenvolver peças que me dão luta, como, por exemplo, uns vestidos que fiz para um grupo de danças. São vestidos muito elaborados e cada um com uma medida diferente. São peças que demoram muito tempo a fazer e obedecem a várias provas até ficarem concluídas. Também gosto de fazer roupas de cerimónia, sabe-me bem o toque dos tecidos e depois ver a elegância nos corpos. E adoro fazer peças para bebés. Acho lindo, depois, ver as  sessões fotográficas das crianças com as roupinhas que eu fiz. Sinto-me vaidosa do meu trabalho.

Como surgiu este projeto de ter algumas peças de artesanato?

Na altura da pandemia, começámos com as máscaras. Fiz milhares de máscaras, desde TNT a tecidos de algodão com padrões e, a partir daí, começaram a pedir-me outro tipo de peças. Ninguém saía de casa e então houve um  boom de vendas online. Eu não fui exceção e criei uma página, “A Arte da Tila”, onde ia postando as pecinhas que fazia. Os seguidores começaram a aparecer e os pedidos começaram a crescer. Só me restou mesmo agarrar a oportunidade com unhas e dentes e andar para a frente com o meu projeto. Comecei a fazer os célebres panos de cozinha com barras, aventais, sacos de pão, bolsas, carteiras e peças de vestuário para criança, que estavam muito na moda na altura e continuam. Depois foram-me lançando desafios de fazer peças novas e diferentes e eu fui sempre conseguindo desenvolver. Nem descanso enquanto não consigo fazer.

Pode apresentar o que tem nesta banca do stock off?

No stock off e em outras feiras de artesanato ou exposições tenho desde roupas para bebé a peças para a casa, para a praia, trabalho, etc. Tudo o que seja relacionado com costuras, eu tenho ou posso fazer a pedido do cliente.

Parece que hoje voltamos aquelas coisas de antigamente (sacos do pão, etc) mas eu sei que também fez e faz roupas para designers de moda famosos?

Sim, é verdade. E isso encheu-me de orgulho. Afinal, os designers de moda são exigentes e rodeiam-se de profissionais que executam bem as suas funções. Isso, para mim, foi a prova que o meu trabalho é de qualidade. No início, senti o peso da responsabilidade, porque desenvolver peças diferentes do que estava habituada e, ainda por cima, com o cunho de uma marca, dá-nos um “friozinho na barriga”. Tudo tinha que estar perfeito e não havia lugar a “emendas” se a peça não acentasse bem. Mas fui-me habituando e, mais uma vez, embarquei de corpo e alma nos projetos e estou feliz por o ter feito.

E outros projetos?

Eu gosto de desafios e a verdade é que, como se costuma dizer “se um mata, o outro esfola” , quando me lançam uma proposta, eu não demoro muito a colocá-la em prática. Para já, vou avançar com um atelier de costura, aceitando o convite feito pela MovAlmeirm. Há muitas pessoas que querem aprender a costurar e eu não me importo de passar o meu conhecimento. Depois, estou sempre recetiva a novos projetos e, quando surgirem novas ideias, minhas ou lançadas por outras pessoas, eu cá estou para arregaçar mangas e avançar sem medos!