“Alimentar é dar vida” no Banco Alimentar Contra a Fome de Santarém

O presidente do Banco Alimentar de Santarém, Marco Aurélio Constantino, fala-nos sobre a atividade desta instituição solidária, poucos dias antes de se iniciar mais uma Campanha de Recolha de Alimentos que vai já na sua 56ª edição. Em 2022, o Banco Alimentar distribuiu em Almeirim, cerca de 18 toneladas e apoiou cerca de 1050 pessoas em situação de carência alimentar.

Nos próximos dias 2 e 3 de Dezembro vai decorrer, nos supermercados e hipermercados do concelho, mais uma campanha para angariação de alimentos. Qual é a importância desta recolha nestes tempos tão difíceis? 

Muito obrigado por este convite para me darem a oportunidade de falar um pouco sobre o Banco Alimentar. O Banco Alimentar é uma instituição silenciosa, que presta uma ajuda que se procura que também seja silenciosa, destinada a quem mais precisa, a quem mais carece de alimentos. Uma instituição que “aparece”, de facto, duas vezes por ano, como vai acontecer agora nos dias 2 e 3 de Dezembro. E tem visibilidade porque faz uma recolha de bens alimentares nos supermercados, em todo o território Nacional. São muitos bancos alimentares e muitas instituições a beneficiar desta ação, mas funciona, também, ao longo de todo o ano. Funciona 365 dias por ano e o Banco Alimentar Contra a Fome de Santarém revela a sua importância através daquelas que são as respostas que queremos prestar à população, num crescendo que se tem vindo a assistir, no que respeita aos pedidos de apoio alimentar. É de todos conhecida a realidade que temos, com dificuldades, com aumentos, com a inflação do aumento do custo de vida, em geral, e quem estiver em situações mais frágeis, mais vulnerável e sacrifica aquilo que é possível sacrificar, infelizmente, sacrifica os bens alimentares, a sua subsistência, em determinada medida. O Banco Alimentar Contra a Fome de Santarém foi constituído em 2008. Desde há cerca de 15 anos que tem vindo a desenvolver estas campanhas alimentares, que, por um lado, são de uma grande importância mas que, por outro, a sua importância é relativa, dado que o banco não vive só das doações de bens alimentares recolhidos nas superfícies comerciais nestas duas campanhas, por regra, a primeira em maio e a segunda em novembro ou dezembro.

Resumindo, podem receber doações o ano inteiro? 

Sim, recebemos doações o ano inteiro. 

Quem faz essas doações fora das campanhas?  

Recebemos doações quer de pessoas particulares ou empresas, qualquer pessoa pode fazer a sua doação ao Banco Alimentar através do site que a própria Federação dos Bancos Alimentares, à qual o Banco Alimentar de Santarém está associado, disponibiliza. Pode apoiar com bens alimentares mas, sobretudo, os Bancos Alimentares existem também para combater o desperdício. Por isso, ao longo do ano, nós não fazemos recolhas de bens que estão na prateleira das superfícies, como esta, ao mesmo tempo que recolhemos bens que, de outro modo, iriam parar ao contentor, não sendo lixo. Recolhemos esses alimentos no seu tempo de vida útil e, com isso, conseguimos evitar que também não haja desperdício de bens. O nosso principal motivo de existência é este, combatermos o desperdício e, por isso, nós trabalhamos de perto com as superfícies comerciais que ,diariamente, vão tendo alimentos que, ou por serem mais perecíveis ou por terem datas de validade mais curtas, acabam por não ser vendidos e acabam por ter um destino que precisa de ser acautelado. Nós recebemos esses bens ou fazemos a sua recolha, quase diariamente, em todas as superfícies comerciais que estão na área da nossa intervenção, especialmente em Almeirim, Cartaxo e Santarém, uma vez que temos o armazém em Santarém. Além disso, recolhemos também junto dos produtores, junto de instituições de distribuição e de transformação. Bens que estão nos seus stocks ou casos de excesso de produção ou que não conseguiram escoar pelo calibre dos produtos e que nós recolhemos e distribuímos. Nós estamos a falar da recolha, por campanha, de cerca de 40 toneladas, mas em 2022 distribuímos cerca de 150 toneladas em todos os concelhos da nossa área de abrangência. 

 E em Almeirim, quantas toneladas é que foram distribuídas? 

Almeirim é um dos nossos grandes concelhos de apoio e de ação, o que também é reconhecido por todos. Há uma enorme sinergia entre as instituições e empresas que aqui estão sediadas, que nos dão diretamente esses produtos, ou através de outras formas de angariação, e entre as pessoas individuais que nos apoiam nas campanhas.Isso reflete-se no bolo todo, todo o conjunto de alimentos que depois distribuímos por um critério objetivo, que tem que ver com o número de pessoas em situação de carência e o número de pessoas apoiadas por instituições, seja por alimentos ou por refeições confecionadas. Em 2022, nós distribuímos, em Almeirim, cerca de 18 toneladas e apoiamos cerca de 1050 pessoas em situação de carência alimentar. 

Gostava que me explicasse melhor, como é esse apoio a instituições em Almeirim, uma vez que não o fazem diretamente às pessoas.  

Nós apoiamos oito instituições em Almeirim e, através destas, apoiamos cerca de 1045 pessoas em 2022. São elas: FAC-Fraterna Ajuda Cristã, CÁRITAS Fazendas, Marianos e Paços, Projecto ABRAÇAR, ACRAS- Associação Cristã de Reinserção e Apoio Social, ASSBR- Associação de Solidariedade Social de Benfica do Ribatejo, CPBES- Centro Paroquial Bem Estar Social Vida Plena, CRIAL-Centro de Recuperação Infantil de Almeirim e Santa Casa da Misericórdia de Almeirim.

Então é a estas instituições que as pessoas se devem dirigir, no caso de necessitarem de apoio, e não ao Banco Alimentar?

É verdade. Os últimos dois anos, foram anos em que constatámos a existência de um maior número de pessoas a dirigir-se a nós, Banco Alimentar. Nenhum desses pedidos ficou sem resposta. Dirigimo-los para as estruturas de apoio social local, em Santarém ou em Almeirim, ou diretamente para as instituições específicas quando identificamos quais as que ficam na sua área de residência. Aí, é feita a análise do seu caso, e estando em situação de vulnerabilidade, entram na rede de apoio social. Não apoiamos qualquer pessoa que nos evoca que está numa situação de necessidade porque isso carece de uma análise, e não somos nós que a fazemos. Serão estas instituições, que nós apoiamos, as instituições parceiras, que juntamente com os serviços sociais, fazem a identificação das pessoas. Ficando incluídas na rede social, beneficiam de acordo com aquilo que lhes cabe e de acordo com essa distribuição equitativa que as próprias instituições fazem. Há uma preocupação grande, e achamos que essa distribuição mais equitativa, também faz chegar a ajuda a quem realmente precisa, sem que haja uma duplicação de apoios porque, infelizmente, conhecemos todos situações destas, em que as pessoas procuram apoio em mais do que uma instituição. Com a informação centralizada sobre quem é apoiado, o que não está ao nosso alcance, permite que seja só apoiado quem, efetivamente, necessita e pelas instituições que estão mais vocacionadas para esse efeito, que são essas IPSS’s a nível local. 

Não trabalhando diretamente com estas pessoas mas, possivelmente, tendo alguma avaliação indireta dos casos, é capaz de me caracterizar que tipo de pessoas pedem atualmente apoio?

Hoje temos situações de vulnerabilidade em todos os extratos sociais, diria até que, de um momento para o outro, as pessoas ficam com necessidade de apoio, e apoio naquilo que é o acesso a bens essenciais, como acontece com os alimentos. Isso é transversal, não só pessoas que vivem desfavorecidas na habitação, ou que vivem em situações de desemprego…

Mas, às vezes, têm isso tudo, só não têm dinheiro para pôr comida na mesa…

E que sacrificam estes bens mais fáceis para poder corresponder a outras obrigações, as rendas, por exemplo. O aumento das rendas repercutiu-se em muitas famílias, nos jovens também. É curioso ver que, nestes novos pedidos, que vêm diretamente para o banco, estamos a falar de pessoas com situações até de emprego, mas que mesmo com o rendimento que têm, este não lhes permite fazer chegar a comida, todos os dias, para os seus filhos.

Os salários são muito baixos…

Os salários são muitos baixos e os custos aumentaram, ou seja, não estamos a falar, necessariamente, de pessoas em situação de desemprego, estamos a falar de pessoas em situações ativas, mas cujo  rendimento que auferem, os apoios sociais de que já beneficiam, não são suficientes para suprir todas as suas obrigações, Todos esses problemas e os agravamentos, criaram uma outra realidade de pessoas a precisarem de ajuda que não só as pessoas idosas, isoladas que não têm estrutura familiar de apoio, em situações de vulnerabilidade na sua habitação. Já temos outros extratos sociais com problemas também neste nível de carência alimentar. 

Nós, que por força da nossa natureza, somos seres comunitários, vamos ser solidários, vamos ajudar quem realmente precisa. Nós, cidadãos comuns, mas também empresas que puderem ajudar. 

A campanha vai decorrer entre 2 e 3 de dezembro. São dois dias em que esta massa humana de solidariedade vai para a rua, aparece nas superfícies para dar oportunidade a quem também quer ajudar com bens alimentar. Podem ser doados os mais diversos bens alimentares, nós trabalhamos sobretudo com bens não perecíveis mas, mesmo no caso de alguns bens perecíveis, não os desperdiçamos. São alimentos que são canalizados de imediato, nos dias seguintes, depois da campanha, para as instituições. Não indo às superfícies, não deixa de poder apoiar através dos canais da internet do Banco Alimentar, por exemplo, fazendo apoio em alimentos, ou através do vale. Nesta mesma semana, que agora está em curso, temos vários supermercados a funcionar com a campanha vale, ou seja, a possibilidade das pessoas  que, não entregando alimentos, podem comprar um vale que equivale a um determinado valor em euros.  Depois as superfícies irão abastecer-nos com esses alimentos. Também as empresas podem fazê-lo ao longo do ano quer em bens alimentares, quando esse é o seu foco de produção, mas também em donativos. Nós vivemos sobretudo de dádivas. É um dos nossos pilares, a dádiva, a gratuidade da prestação do nosso trabalho. Não vendemos nada com o qual nos possamos financiar, por isso, dependemos da boa ação, da solidariedade das missões de responsabilidade social que, por exemplo, as empresas aqui no distrito assumem e que nos têm apoiado para que possamos, de facto, fazer chegar estes alimentos a quem deles mais precisa. Precisamos também de contar com esses apoios e de os reforçar. O Banco Alimentar distribuiu alimentos mas tem custos de funcionamento, tem uma estrutura que, não sendo muito complexa, implica o suporte financeiro.

Quanto voluntários é que vai ter na rua, nos dias 2 e 3 de dezembro?

Vamos ter cerca de 1000! Só no Banco Alimentar de Santarém, vamos ter mais de 100 voluntários distribuídos pelos vários concelhos da nossa área de abrangência: Benavente, Salvaterra de Magos, Almeirim, Coruche, Alpiarça, Chamusca, e depois a norte do rio, Golegã, Santarém, Rio Maior, Cartaxo e, também em Azambuja. Faremos recolha nestes concelhos, em todas as superfícies que conseguirmos, com uma rede de voluntários e de pessoas que se mobilizaram, e a quem temos de agradecer porque é com a sua ajuda, com esse apoio gratuito que também conseguimos fazer a recolha. Contamos ainda com o apoio das instituições, designadamente, dos municípios a quem eu não posso deixar de  endereçar publicamente, uma palavra de agradecimento porque, nesta altura, nos disponibilizam os seus apoios, permitindo que os alimentos cheguem ao armazém para depois os podermos distribuir. Estamos a falar de uma rede bastante alargada, quer em número de pessoas, quer em número de instituições que se mobilizam neste fim de semana agora, de 2 e 3 de dezembro, para que consigamos, de facto, reunir o maior número de dádivas possível para complementar as outras angariações que fazemos.